João Neto: No Tempo das Aventuras

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Tanto eu quanto o Nelsinho Eufrozino levamos um susto quando nos encontramos no calçadão da rua Paraná, depois de mais de quarenta anos... Eu não acreditei que ele envelheceu, ele não acreditou em meus cabelos grisalhos.

Reviramos nossos baús e despejamos nossas histórias, de fazer inveja a Antoine de Saint-Exupéry.

Enquanto, na frente da Nunes, pessoas passavam sem nos notar lembramos que, pobres de marré deci, nós mesmos construíamos nossos brinquedos... O cabo de vassoura foi o cavalinho que vimos no filme de faroeste, na Telefunken do vizinho... Lembramos que nosso telefone nada mais era que duas latas de extrato de tomate Elefante com um barbante amarrado no fundo, na verdade, ele servia como condutor de voz.

Nossa primeira rede social: o caderno de perguntas e respostas das meninas da escola!

Lembramos que nosso brinquedo mais “irado” era o carrinho de rolimã: Uma tábua e uma ripa feito “barra de direção”, um rolimã grande na frente e dois menores atrás – era só respirar fundo, se encher de coragem e descer a 120 por hora no asfalto novinho da Dom José Marello, do Seminário até a Pibigás... Ah, o freio era o calcanhar mesmo!

O único brinquedo que nosso dinheiro, às vezes, podia comprar era a tal “caixinha de sorte” que comprávamos na porta do Grupinho, do pipoqueiro Lorêdo, coisa de cinquenta centavos... Do tamanho de uma caixa de fósforos ela continha dentro de si uma surpresa, sem nenhum valor real, mas tínhamos a ilusão de que dentro dela havia um valioso tesouro.

E crescemos domando a vida feito um cavalo bravo, tentando ser feliz na velocidade de um carro de corrida, porém, com a entrada de recursos na velocidade de uma tartaruga menstruada.

Acreditamos que, feito a “caixinha de sorte”, essa mesma vida carregava dentro de si os tesouros que tanto buscávamos. 

Saímos para o mundo e, além de fazer desse mundo nossa casa, conquistá-lo tornou nossa razão de viver. Muitas e grandes vitórias conseguimos.

Derrotas e decepções? Claro que tivemos!

Serviram para lembrar que somos guerreiros de almas frágeis, entretanto, quase sempre imbatíveis!

Prazer em revê-lo, meu amigo Nelsinho.

Acho que foi Deus quem cuidou de nós!

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Este texto é do escritor João Neto, um escritor do cotidiano, foi rotulado, pelo crítico Lau Pacheco, como "piloto da caravela da saudade", em virtude do resgate de momentos vividos na infância e adolescência em Ourinhos. 

Após ter seu conto "Ainda Bem Que Você Veio" viralizado nas redes sociais, ficou conhecido em todo o Brasil. Publicou seu primeiro livro de contos e crônicas em 2019.

João Candido da Silva Neto nasceu em Santa Cruz do Rio Pardo (SP) e veio para Ourinhos com 7 anos em 1967. Ele atuou na COPEL (Cia Paranaense de Energia) onde aposentou-se em 2019. Em 2012 se tornou escritor, tendo seus contos e crônicas publicados semanalmente na Folha de Londrina.