Câmara da Itália aprova nova lei que restringe cidadania para descendentes: 32 milhões de brasileiros podem ser afetados

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A Câmara dos Deputados da Itália aprovou nesta terça-feira (20) um decreto-lei que restringe o reconhecimento da cidadania italiana para descendentes de italianos nascidos fora do país. A medida, que impacta diretamente cerca de 32 milhões de brasileiros com ascendência italiana, agora segue para sanção do presidente Sergio Mattarella, último passo para que entre em vigor de forma definitiva.

O que muda com a nova lei?
Atualmente, a legislação italiana permite que descendentes de italianos, mesmo em gerações distantes como bisnetos e trinetos, tenham o direito ao reconhecimento da cidadania italiana pelo princípio do iure sanguinis (“direito de sangue”). Isso significa que, mesmo nascidos fora da Itália, os descendentes são considerados italianos desde o nascimento, precisando apenas comprovar tal vínculo por meio de processo administrativo ou judicial.

Com a nova lei, a cidadania será limitada a apenas duas gerações — ou seja, filhos e netos de italianos. Bisnetos e demais gerações não terão mais direito ao reconhecimento, a não ser que cumpram exigências específicas que tornem o processo praticamente inviável para grande parte dos interessados.

Além disso, para que um descendente transmita a cidadania aos filhos, não poderá possuir outra nacionalidade. A única exceção prevista é para quem reside legalmente na Itália por pelo menos dois anos antes do nascimento do filho, o que inviabiliza a transmissão em muitos casos, principalmente entre brasileiros.

Impacto direto na comunidade ítalo-brasileira
O Brasil é, atualmente, um dos países com maior número de pedidos de reconhecimento da cidadania italiana. Em 2024, mais de 20 mil brasileiros obtiveram o passaporte italiano, e 95% dos processos foram por direito de sangue.

A nova legislação, se sancionada, representa um freio importante nessa demanda, que o governo italiano alega estar sobrecarregando os órgãos administrativos e sendo alvo de fraudes.

Segundo nota do governo, a mudança busca garantir que apenas aqueles com um vínculo efetivo com a Itália tenham acesso à cidadania, seguindo práticas mais alinhadas com outros países da União Europeia.

Exceções e regras de transição
  • Quem já protocolou o pedido de cidadania — seja administrativa ou judicialmente — até as 23h59 do dia 27 de março de 2025 (horário de Roma), não será afetado.
  • Menores de idade ainda poderão ter a cidadania reconhecida se os pais a solicitarem dentro de um ano após o nascimento ou adoção. Também será possível requerer a cidadania após dois anos de residência contínua na Itália.
  • Uma regra de transição permitirá que filhos de italianos com até 18 anos, na data da sanção, possam ter o direito garantido até 31 de maio de 2026, desde que os pais já tenham cidadania ou protocolado pedido até março de 2025.
E quem trabalha na Itália?
O decreto também traz uma previsão para facilitar a permanência legal de descendentes de italianos que buscam trabalho no país, mesmo ultrapassando os limites de cotas de imigração. Essa medida deve beneficiar especialmente países com histórico de imigração italiana, como o Brasil, que recebeu mais de um milhão de italianos entre o final do século 19 e início do século 20.

Há chance de reversão?
Juristas apontam possíveis inconstitucionalidades na nova norma e em sua forma de tramitação. Ainda não há, no entanto, uma contestação formal apresentada à Corte Constitucional Italiana. Até lá, a expectativa gira em torno da decisão final do presidente Mattarella.

Se sancionada, a medida poderá transformar radicalmente o acesso à cidadania italiana para milhões de descendentes brasileiros, encerrando um ciclo de reconhecimento de vínculos históricos entre os dois países e criando novas barreiras à dupla nacionalidade.