Esquema bilionário de fraudes no INSS derruba presidente da autarquia; Sindicato de irmão de Lula é alvo

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Uma operação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrada nesta quarta-feira (23), revelou um esquema bilionário de fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que levou à demissão do presidente do órgão, Alessandro Stefanutto, e ao afastamento de cinco servidores públicos. A operação, batizada de Sem Desconto, estima que os prejuízos causados aos aposentados e pensionistas chegam a R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.

O esquema
Segundo as investigações, o golpe consistia no desconto indevido de mensalidades associativas diretamente nos benefícios pagos pelo INSS, sem autorização dos beneficiários. Os valores eram cobrados como se os aposentados tivessem aderido a associações de classe, muitas delas fictícias ou com estrutura inexistente. Os alvos principais do esquema são entidades que alegavam oferecer serviços como assistência jurídica e benefícios em planos de saúde, mas que, na prática, não prestavam os serviços prometidos.

Em 97% dos casos analisados pela CGU, os entrevistados afirmaram nunca ter autorizado os descontos. Além disso, 72% das entidades sequer apresentaram a documentação obrigatória para que os débitos fossem autorizados pelo INSS.

Uma das entidades envolvidas é o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), cujo vice-presidente é José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão do presidente Lula. A entidade foi alvo de busca e apreensão e foi descredenciada. Em nota, o Sindnapi declarou apoio às investigações e afirmou atuar de forma legal e transparente.


O sindicato gerido por Frei Chico foi alvo de buscas da PF nesta quarta e também foi descredenciado a continuar atuando em nome de aposentados. A entidade nega as acusações. (Evandro Éboli/VEJA)


A operação
A operação Sem Desconto cumpriu 211 mandados de busca e apreensão em 34 cidades de 13 estados e no Distrito Federal. Também foram expedidas seis prisões temporárias — cinco delas já cumpridas. Entre os bens apreendidos estão carros de luxo, joias, obras de arte e dinheiro em espécie. A Justiça também determinou o bloqueio de mais de R$ 1 bilhão em bens.

Além de Stefanutto, outros cinco servidores da cúpula do INSS foram afastados:
  • Virgílio Antônio Ribeiro de Oliveira Filho – procurador-geral do INSS
  • Giovani Batista Fassarella Spiecker – coordenador-geral de Suporte ao Atendimento
  • Vanderlei Barbosa dos Santos – diretor de Benefícios e Relacionamento com o Cidadão
  • Jacimar Fonseca da Silva – coordenador-geral de Pagamentos e Benefícios
  • Um policial federal cujo nome não foi divulgado, suspeito de envolvimento com o grupo


A queda de Stefanutto

Alessandro Stefanutto foi indicado ao cargo em julho de 2023 pelo ministro da Previdência, Carlos Lupi, e era filiado ao PDT. Ele tem formação em Direito, com mestrado em sistemas de seguridade social, e já havia ocupado cargos técnicos no INSS e no governo federal. Stefanutto já havia sido afastado pela Justiça antes de ser oficialmente exonerado pelo presidente Lula.

Segundo fontes da PF, endereços ligados ao ex-presidente do INSS foram alvos de busca e apreensão. A demissão foi oficializada após reunião de emergência no Planalto, que contou com a participação dos ministros da Justiça, Ricardo Lewandowski; da CGU, Vinícius de Carvalho; da Previdência, Carlos Lupi; e do diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues.

Lupi, que havia indicado Stefanutto, inicialmente defendeu o direito à ampla defesa, mas a exoneração foi confirmada horas depois, diante da gravidade das suspeitas. O presidente do PSB, Carlos Siqueira, também se manifestou, destacando que Stefanutto se filiou ao partido por iniciativa própria e que a sigla não participou de sua indicação.

Investigações e próximos passos
A apuração começou em 2023, de forma administrativa, pela CGU. Com a identificação de indícios criminais, a Polícia Federal foi acionada e instaurou 12 inquéritos. Os investigados poderão responder por corrupção ativa e passiva, organização criminosa, falsificação de documentos, violação de sigilo funcional e lavagem de dinheiro.

O governo federal tenta, agora, conter o desgaste político, especialmente pelo envolvimento indireto de figuras próximas ao presidente Lula. A promessa, segundo os ministros, é de rigor absoluto na apuração das responsabilidades e revisão dos mecanismos de controle dos descontos em folha de aposentados.

O escândalo expõe falhas sistêmicas na fiscalização de entidades conveniadas ao INSS e levanta questionamentos sobre a vulnerabilidade dos sistemas de autorização de descontos em benefícios sociais.