João Neto: Sonhar com a paz é assim!

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As flores, os punhais, os batons, tudo, absolutamente tudo, foi engavetado...

As mortes cessaram, por conta disso dispensaram os serviços dos maquiadores de defuntos... As flores vermelhas deixaram de enfeitar funerais - hoje decoram presépios... Punhais deixaram de correr sangue. A gangue da esquina converteu-se em grupo de oração - hoje pulverizam cânticos gregorianos.

Dinheiro e outros metais saíram de circulação, faz tempo... O desaparecimento do papel moeda decretou a falência dos banqueiros e os transformaram em ceramistas de porcelanas encantadas... As gaiolas foram derretidas em alto-fornos ultrapotentes...

João Neto (Arquivo Pessoal)

Os pássaros redescobriram o dom de voar - estão menos apáticos, mais coloridos e falantes.

Sem clientela os botecos encerraram suas atividades, já não comercializam álcool ou outras drogas menos legais... Seus frequentadores dispensaram os cd’s de funk e sertanejo universitário. No lugar dos antigos bares foram instalados os CTH’s (Centros de Tradições Humanas) instituições que, ao som de harpas orientais, buscam a preservação do lado humano dos humanos.

Além dos banqueiros, o fim da moeda corrente desintegrou as classes políticas e por consequência os políticos... A meia dúzia de políticos do bem criou uma cooperativa de voluntariado, além disso, se dedicam à criação de peixes coloridos que, na verdade, não sabemos pra que finalidade. Dizem as más línguas, que os maus políticos (noventa e sete por cento do total) se mudaram para o continente ‘Flowers Red’, criando naquela ilha a “República de La Amabilidad”, a bandeira do novo país é totalmente branca e tem, no centro da flâmula, uma flor vermelha, geometricamente disposta.

A humanidade, hoje exorcizada de todo mal, nem acredita nessa calmaria paradisíaca.

Pacificação sem revolução, tampouco derramamento de sangue... De repente a humanidade se assusta com a paz que tanto esperou e sonhou... Alguns catedráticos afirmam que a simples desmonetização da alma humana foi a causadora de todo o bem.

Seis e quinze da manhã... A música do despertador do meu celular toca “Depende de Nós” e avisa que é hora de acordar. Acordo com a vista embaçada e percebo que tudo continua exatamente igual, que pena, estava tão feliz no meu sonho!