Justiça Federal suspende resolução que autorizava farmacêuticos a prescrever medicamentos

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A Justiça Federal suspendeu, nesta segunda-feira (31), a resolução do Conselho Federal de Farmácia (CFF) que permitia a farmacêuticos prescrever medicamentos, incluindo aqueles que exigem receita médica. A decisão foi tomada após o Conselho Federal de Medicina (CFM) entrar com uma ação para anular a norma. A medida tem caráter liminar, ou seja, suspende a resolução antes do julgamento final do caso.

A decisão foi assinada pelo juiz Aalôr Piacini, da 17ª Vara Federal Civil do Distrito Federal. Em seu despacho, o magistrado argumentou que o balcão de uma farmácia "não é o local para se firmar um diagnóstico e tratamento de uma doença, sob pena do exercício ilegal da medicina". Ele determinou que o CFF divulgue a decisão em seu site e outros canais institucionais, sob pena de multa diária de R$ 100 mil.

A Resolução Contestada
A Resolução CFF Nº 5, publicada no Diário Oficial em 17 de março, estabelecia que apenas farmacêuticos com Registro de Qualificação de Especialista (RQE) em Farmácia Clínica poderiam prescrever medicamentos de venda sob prescrição. Além disso, permitia que esses profissionais renovassem receitas, realizassem exames físicos e solicitassem exames laboratoriais para avaliar a eficácia de um tratamento.

A regulamentação gerou críticas de entidades médicas, que questionaram a capacitação dos farmacêuticos para realizar diagnósticos e definir tratamentos. Na ação judicial, o CFM argumentou que os farmacêuticos não possuem "atribuição legal nem preparação técnica médica para identificar doenças e definir medidas para restabelecer a saúde dos pacientes".

O advogado Henderson Furst, especialista em Bioética e Direito da Saúde, afirmou que a proposta do CFF tenta atender a uma demanda do mercado, mas possui lacunas legais. Ele destacou que os farmacêuticos têm o direito de avaliar a interação medicamentosa, mas não de substituir ou renovar receitas médicas. "Se um farmacêutico solicitar exames, um plano de saúde ou o SUS irá aceitar essa solicitação?", questionou.

A Posição do Conselho Federal de Farmácia
Em resposta, o CFF rebateu as críticas e afirmou que a prescrição terapêutica "não é atividade exclusiva dos médicos". O conselho defendeu que a medida está amparada na legislação que regula a profissão e nas diretrizes do curso de farmácia. Além disso, ressaltou que os farmacêuticos não poderiam prescrever medicamentos com "notificação de receita", como os de tarja preta.

O CFF também citou exemplos de reconhecimento da atuação dos farmacêuticos, como a prescrição de profilaxias pré e pós-exposição ao HIV (PrEP e PEP), que já é regulamentada e incentivada pelo Ministério da Saúde.

Histórico de Disputas na Justiça
A suspensão da nova resolução ocorre poucos meses após a mesma 17ª Vara Federal do DF anular outra norma do CFF, a Resolução 586/2013, que autorizava farmacêuticos a prescrever medicamentos que não exigem receita médica. O CFF ainda pode recorrer da decisão.

A disputa judicial reflete uma batalha maior pelo espaço de atuação de diferentes profissionais da saúde no Brasil, como já ocorreu no mercado de estética e outros segmentos. Especialistas alertam que, no fim, a responsabilidade pela segurança dos pacientes recai sobre eles próprios, quando essa questão deveria ser tratada como parte da política de saúde pública.